de Haruki Murakami. 2002.
"A 4 de Outubro de 1957, a União Soviética lançou, a partir do Centro Espacial de Baikonour, na República do Cazaquistão, o primeiro satélite artificial do mundo, o Sputnik I. Media 58 cm de diâmetro, pesava 83,6 kg e completou a órbita da Terra em 96 min e 12 segundos.
A 3 de Novembro do mesmo ano, o Sputnik II foi por sua vez lançado com êxito. A bordo seguia a cadela Laika, que se tornou a primeira criatura viva a sair da atmosfera da Terra, mas o satélite nunca foi recuperado, e Laika foi assim sacrificada em nome da pesquisa biológica no espaço". (in The Complete Chronicle of World History")
É interessante como o autor faz paralelismo entre coisas que à partida não parecem ter nada a ver. O livro trata de um triângulo amoroso em que K ama S, S ama M, e M anda perdida entre dois mundos. Trata de amizade, amor, relações homossexuais, existencialismo, realidade versus sonho, solidão, escrita e música clássica. Creio que muito resumidamente é isto.
Gostei porque mais uma vez H. Murakami consegue escrever de forma ondulante... o romance ora nos prende ora nos afasta mas quando nos afasta imediadamente recapta a nossa atenção. Gosto disso.
Mais uma vez aqui ficam as frases ou ideias que me ficaram, agora sim por sua vez, deste livro:
Primeiro que tudo o paralelismo. O satélite representa aqui o indivíduo. Lançado ao espaço (realidade) onde nada mais encontra do que escuridão (solidão) e o seu trajecto (vida) a ser bem-sucedido implica manter-se intacto e não se desintegrar ainda que tudo pareça forçá-lo a isso.
A história do cão sacrificado também tem um simbolismo. Antigamente na China as cidades estavam rodeadas por altas muralhas onde se abriam portas enormes e imponentes. As pessoas acreditavam que nelas residia a alma da cidade. Tal como na Europa medieval as gentes consideravam a catedral e a praça como o coração da cidade.
Aquelas portas (sagradas) eram criadas da seguinte forma: as pessoas iam de carroça até aos antigos campos de batalha e recolhiam as ossadas que por lá se encontrassem espalhadas ou enterradas. Depois construíam uma porta enorme à entrada da cidade e deixavam ficar todos aqueles ossos lá dentro. Esperavam dessa forma que os soldados mortos, honrando as suas almas, continuariam sempre a proteger a cidade. Além disso, após a contrução da porta eram também levados até lá cães vivos aos quais se lhes cortava a goela, aspergindo o portão com o sangue ainda morno. Estas gentes acreditavam que só essa mistura de sangue fresco e ossos ressequidos, como que por magia, daria vida às almas dos guerreiros mortos. Um ritual de baptismo mágico que fazia a ligação entre dois mundos.
"...enchi os pulmões de ar e mergulhei no mar da minha consciência... afastando as águas pesadas com a força das mãos fui até ao fundo e agarrei-me a uma pedra... a água fazia uma pressão enorme sobre os meus tímpanos...tentei a todo o custo resistir. Uma vez tomada a decisão, não foi assim tão difícil. Aclimatei-me aos repetidos sinais de caos - à pressão da água, à falta de ar, à escuridão gelada. O tempo invertera-se, andava para trás, desaparecia, reorganizava-se. O mundo expandiu-se infinitamente... Imagens nítidas passavam sem fazer barulho por corredores escuros, como medusas, almas à deriva. Evitei olhar para elas. Se desse sinal de tê-las reconhecido começariam de imediato a fazer sentido. O sentido estava ligado à temporalidade e esta obrigava-me a regressar à superfície das águas. Fechei a mente o mais possível, até a procissão acabar de passar."
Pergunto-me se será assim uma viagem à nossa mente? Um limiar de loucura que nos permita por breves momentos discernir um mínimo de coerência e verdade no total e aparente caos das coisas vividas e das coisas por descobrir.
"Não sou do género de odiar pessoas...
- Isso é porque não esperas nada de ninguém..."
Talvez isto seja verdade. Apenas sentimos ódio após expectativas desfeitas, durante um período de desilusão. Se nada esperarmos, se nada exigirmos e apenas aceitarmos... nunca nos iremos sentir inseguros, feridos ou odientos.
"Porque será que estamos condenados a ser assim tão solitários? Qual a razão de tudo isto? Há tanta, tanta gente neste mundo, todos à espera de qualquer coisa uns dos outros, e, contudo, irremediavelmente afastados. Porquê? Continuará a Terra a girar unicamente para alimentar a solidão dos homens?"
Sim, e talvez por isso mesmo. Porque estamos todos à espera de qualquer coisa uns dos outros...
Sim, e talvez por isso mesmo. Porque estamos todos à espera de qualquer coisa uns dos outros...
"Que bom. Estamos ambos a olhar para a mesma Lua do mesmo mundo. Estamos ligados à realidade através do mesmo fio. Só preciso de o ir puxando devagarinho para mim."
Comentários
Safei-me muito bem no Lusíadas e nos Maias porque estudei bem os resumos.
Gosto dos livros do Asterix e têm piadas e coisas subtis que dão que pensar. Há algo escondido e há uma mensagem muito interessante, de amizade forte, por vezes para lá de uma simples amizade entre dois homens (Asterix e Obelix) que quase bate na homossexualidade em determinadas partes mas totalmente desmistificada pelo facto de Obelix estar sempre apaixonado e de haver uma cenas de paixão de Asterix.
Qual o objectivo de transmitir uma amizade tão forte?
Para mim essa amizade é similar à que se verifica com três amigos de infância e acho que estes livros são uma obra à amizade. E de querer mostrar que realmente a amizade é das coisas mais preciosas.
Mas tenho de admitir que é triste de não ter uma personalidade com a paciência para a leitura de coisas não técnicas. Só gosto de ler coisas que me ensinem a fazer...
Por acaso tem havido uma safa. Aqueles livros que são lidos e podemos usar em mp3 enquanto estamos a fazer outras coisas...
Uff safo-me com isso....
1 beijinho
beijinhos