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O Suicídio

Ontem, dia 10 de Outubro, assinalou-se do Dia Mundial da Saúde Mental. Entretanto no dia 10 de Setembro foi o Dia Mundial de Prevenção do Suicídio.
Houve um homem que se suicidou ontem aqui nos arredores.

O Suicídio (enquanto acto voluntário e intencional de alguém colocar termo à sua própria vida) sempre foi um assunto que me interessou porque não consigo decidir se este será um acto de coragem ou de cobardia. Talvez o que leve alguém a suicidar-se seja mesmo este "estar" entre extremos, um "estar" perdido entre o total desespero e a esperança e força de enfrentar os problemas.

Há algumas celebridades que se suicidaram e isso foi notícia a nível mundial, mas acho que toda a gente já conheceu alguém, relativamente próximo (familiar, amigo, conhecido...) que também cometeu suicídio. A primeira vez que isso me aconteceu foi chocante e intrigante. Era um rapariga de 15 anos, sobrinha de uns amigos dos meus pais. Eu cheguei a conhecê-la, brincámos algumas vezes no monte dos pais dela e daquilo que me recordava era uma criança meiga, simpática e completamente normal. Passados alguns anos dessas brincadeiras oiço o meu pai chegar a casa e dizer que tinha acontecido uma tragédia... a ... tinha sido encontrada morta. Deu um tiro na cabeça, tinha a arma do pai ao lado do corpo, estava completamente vestida de preto, e tinha deixado uma rosa vermelha e uma carta escrita. Foi um choque... e ainda hoje quando penso nisso, continua a ser. Veio-se a a saber (ou deduzir) depois, pela carta e pelas conversas das amigas, que ela terá sido influenciada pela morte de Kurt Cobain, o famoso vocalista dos Nirvana. Este tipo de fenónemo já está identificado e tem (supostamente) explicação - de pessoas que se deixam influenciar.
Enfim... acho que períodos de dúvida e sofrimento (físico ou espiritual) toda a gente tem na vida, e muito possivelmente às vezes pensa-se em terminar de forma rápida e definitiva com tudo isso, mas colocar essa ideia em prática é algo demasiado complexo e cujo comportamento exige que nos debrucemos com cuidado sobre ele.

Actualmente o suicídio é a 10.ª causa de morte no mundo (com cerca de 1 milhão de pessoas por ano). No entanto se falarmos de suicídio não-fatal (o indivíduo não chega a falecer) os números sobem para os 15 milhões de pessoas por ano (em média). De facto, quando se fala de Para-Suicídio (este é mais frequente nas mulheres e não tem intenção efectiva de cumprir o acto para morrer mas antes serve para chamar a atenção ou mudar comportamentos) e Tentativa de Suicídio (o indivíduo tenta intencionalmente a morte mas é impedido antes que isso aconteça) os número são bastante superiores.

As formas de encarar e até de realizar o acto de suicídio diferem consoante a religião, parte do mundo e até ao longo dos anos. Por exemplo, no Japão, o seppuku que os samurais exerciam era um acto respeitado que tinha como significado expiação de fracasso ou como forma de protesto. Há religiões em que a viúva se autoimula no funeral do marido. Há também os kamikazes ou atentados suicidas que desde o 11 de Setembro entraram (infelizmente) no nosso quotidiano de notícias mundiais. Não esqueçamos a controversa eutanásia e a ortotanásia. E ainda o suicídio em massa, normamente associado a seitas ou grupos religiosos.

Penso que a forma mais comum de suicídio será a automutilação (intoxicação, afogamento, auto-agressão, utilização de arma de fogo, etc), embora não tenha confirmação disso.

Não sei se já ouviram falar do Efeito de Wherter, faz referência a um livro de Goethe (séc. XVIII) em que a personagem principal é um jovem que sofre desventuras amorosas e não vendo outra saída práctica comete suicídio para acabar com o seu sofrimento. Este efeito é também chamado de efeito imitação pois naquela altura houve uma onda de suicídios entre jovens europeus que pelos vistos pensaram que a saída para os seus problemas era a mesma que Wherter tinha escolhido... Aqui se discute muito o grau de susceptibilidade de ser influenciado que cada pessoa tem. De que depende isso? É que esse é um factor muito importante na decisão de cometer ou não o suicídio. Sabem que há estudos que referem a existência de relação positiva entre a quantidade e nível de descrição das notícias nos media sobre suicídio e o número de suicídios ou tentativas? Não é por acaso que normamente os casos de suicídios não são abordados de forma muito aberta ou descritiva, porque há a consciência social de que isso impulsiona e incentiva algumas pessoas a fazê-lo também... especialmente se as notícias forem de pessoas famosas que colocaram termo à vida.

Mas o que leva alguém a terminar com a própria vida??!! Pode ser fruto de doença ou transtorno mental, abuso de drogas, pode até ser genético e pode simplesmente ser resultado de problemas a nível social. Uma coisa é certa, têm de existir um conjunto de factores que expliquem isso. Já há tempo que ando com esta ideia na cabeça e talvez agora, terminado o dos doentes com VIH/SIDA (foi a minha tese de mestrado....ufa!) em que identifiquei alguns factores de risco e factores protectores no seu tempo de sobrevivência, seja altura de começar a concretizar o estudo sobre o indivíduo suicida.

Sei que o post já vai extenso mas há dados importantes e que não quero deixar de referir. É incrível como o nível de vida das populações têm vindo a aumentar ao longo dos anos mas a taxa de suicídios cresceu 60% nos últimos 50 anos. Talvez porque o facto de termos "coisas" não significa que tenhamos felicidade... e a felicidade dependerá então do quê? De nós mesmos? Do meio em que vivemos? Da nossa cultura? Da etnia (sabiam que a taxa de suicídio entre hispânicos e africanos é das mais baixas no mundo)?...

O país com maior número absoluto de suicídios é a China (obviamente....dada a sua extensão territorial densamente habitada...), seguida da Índia e Japão. Por isto é que a nível mundial a Ásia apresenta o maior número aboluto de suicídios.
Na Europa, países como a Lituânia, Estónia, Rússia, Letónia e Hungria apresentam os maiores rácios de suicídio por 100 mil habitantes.
Em Portugal ocorrem actualmente cerca de 1200 casos por ano. A taxa de suicídio nacional é de 11,1 pessoas por 100 mil habitantes. Por sexo há uma grande disparidade. Os homens têm uma taxa de 17,1 e as mulheres de 5 suicídios por cada 100 mil habitantes, respectivamente. Os meios mais comuns são o enforcamento, arma de fogo (no caso dos homens)  e afogamento (no caso das mulheres). O país tem das taxas mais baixas de suicídio nos jovens masculinos dos 15 aos 24 anos e nas mulheres em geral. Portanto, o grupo mais crítico são os homens com mais idade (especialmente acima dos 50 anos).
O concelho de Odemira, no Baixo Alentejo (este com 24 suicídios por 100 mil habitantes), é um caso de estudo a nível mundial, especialmente a freguesia de Sabóia. O concelho apresenta (só...) a mais elevada taxa a nível mundial: 61 suicídios por 100 mil habitantes. Isto porque, dado o número de população residente (que como sabemos é bastante reduzido e talvez até seja um dos factores principais) há um número muito elevado de pessoas que se suicidam. Especialmente idosos do sexo masculino. O que provoca isto? O isolamento? O clima seco? O efeito-imitação? As cores melancólicas da região? Os genes? A cultura destas gentes?... O que é???

Como é que a região espanhola da Andaluzia, mesmo ao lado Baixo Alentejo, tem das taxas de suicídio mais reduzidas do mundo, e embora o clima seja muito semelhante apresentam um nível de alegria e felicidade incomparáveis? Têm vida e sentem ter razões suficientes para bater o pé no chão e fazer frente, cantar e dançar as sevilhanas, num espetáculo de cores, movimento e paixão. Porque é que alguns povos parecem ter mais alegria inata do que outros?

O que é que leva alguém a querer deixar de viver? E que decidido, faça para isso acontecer?

Comentários

TugaSemNome disse…
Ana, tenho de dizer que adoro a maneira que escreves. Tenho seguido este blog porque realmente tu és uma estrelinha escondida no que à forma como colocas as tuas ideias.

Simplesmente brilhante... Parabéns.

Suicídio - acto em que um individuo, deliberadamente, provoca a morte a sí mesmo.

Como tal definição não temos nada a dizer sobre a razão pela qual há o suicídio.

Pode ser heróico ou cobarde. Depende...

O suicídio é um acto heróico se morres por um ideal ou uma razão nobre. Sei lá... Salvar outra pessoa.

Morrer só porque a vida é difícil ou porque correu algo muito mau é algo que me custa a compreender também. Mas gosto de ter uma atitude. Não julgo. Não aponto o dedo. Aquele era um cobarde... há muita coisa que ainda me surpreende nesta vida.

Então e arriscar a vida?
Posso dizer que já arrisquei a vida várias vezes todas por estupidez à excepção de uma.
Foi pela "ganância" de mostrar que fazia e que era melhor, que não tinha medo. Coisas de criança/jovem ... ser o herói. Mostrar não ter medo.

Só arrisquei uma vez a vida por algo que me sinto orgulhoso. E nunca partilhei com ninguém ... simplesmente pelo oposto do que escrevi antes. Não me quero mostrar, não quero que as pessoas pensem... fiz e está feito e só preciso de ser eu a saber.

A minha conclusão:
-Pode ser heróico ou não.
Quando escreves "não consigo decidir se este será um acto de coragem ou de cobardia"
Acho que consegues sim... basta saberes a razão pela qual ele deu termo à própria vida.
-Não julgo e acho que não se deve julgar. Apontar o dedo e dizer... aquele foi um cobarde para mim é errado.

Beijinho
Anónimo disse…
Descobri este blog por acaso´e logo o tema do ultimo post chamou-me a atenção, pois este tema há já algum tempo que não me sai da cabeça... possivelmente eu tambem vá fazer parte das estatisticas... :(
Barrancos
(Baixo Alentejo)
Ana Dionísio disse…
"Anónimo", não sei quem é e o que o leva a pensar em fazer isso mas pedia-lhe um favor: procure ajuda (psicólogo, amigos, família...)quanto antes e diga isso a alguém da sua confiança e que saiba que o pode ajudar. E acima de tudo não se esqueça que o facto de estar vivo é a primeira razão pela qual pode ter esperança na resolução dos seus problemas. Tudo depende da nossa atitude perante as coisas. Morrer não significa resolver nada, apenas se deixar vencer.
Ana Dionísio disse…
Muito obrigada Tuga pelas tuas palavras. Tambémn acho que tudo é relativo e nunca podemos apontar o dedo a quem quer que seja porque diferentes pessoas em iguais circunstâncias simplesmente reagem de maneira diferente e portanto não é previsivel ou explicável o desfecho de cada caso.
José Luís disse…
Ola Ana :)
É realmente muito complexo este tema. Eu penso que cada caso é único. Acho que as pessoas que cometem este acto estão num estado de depressão profunda, não vêm qualquer esperança para a resolução dos seus problemas e acabam por fazer esta escolha como sendo uma tentativa de aliviar o seu sofrimento intenso. A falta de esperança é na minha opinião a grande causa.
"Anónimo" enquanto há vida há eperança, não se renda tão facilmente, há tanto para fazer e conhecer nesta vida. Não se esqueça que existem pessoas que dariam tudo para ter nem que fosse mais um dia de vida...

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