de José Saramago. 1985.
Foi uma demanda que só terminou quando consegui encontrar este livro. Percorri lojas, feiras, perguntei aqui e ali... e um dia sem procurar encontrei-o à venda na internet. Assinalei a data: 01/09/2010, e na primeira página fiz questão de escrever "Finalmente...". Este livro teve entrada directa para a minha cabeceira. E lá permaneceu até há uns dias atrás. Não o quis ler de repente, até porque ler poemas não é o mesmo do que ler romances, artigos, e outros géneros. A poesia exige que nos encontremos em determinado estado de concentração e espírito. Caso contrário não conseguiremos ver as belas imagens ou as verdadeiras mensagens que as palavras podem ter. Se forem lidas só porque sim, não passarão de apenas... palavras. Podem rimar ou não, para quem lhes quer atribuir um sentido e encontrar um significado isso é algo meramente acessório.
Vendo bem o tempo que decorreu desde que o comprei até agora que lhe folhei todas as páginas, senti os seus poemas e marquei os que mais me disseram... reparo que me ensinou e mostrou uma coisa: o tempo passa mesmo muito rápido, e eu, para além de nunca o conseguir acompanhar e fazer-lhe par, faço-lhe até pior... demoro imenso tempo para conseguir sentir as coisas de verdade, mas tal como cão que não larga o osso, não as largo até cá dentro sentir que as percebo mesmo. E quando as sinto, mesmo que "fora de prazo" e mesmo que esse sentimento dure apenas um instante de tempo... para mim valeu a pena, porque pelo menos são de verdade. E não há coisa mais plena do que a verdade.
Quanto ao autor, venero os seus raciocínios e a sensibilidade de cada uma das suas palavras.
O meu poema preferido é "Arte de Amar", como aliás já tinha referido e já aqui transcrevi em Junho/2010.
Outros ficaram a bailar na minha cabeça, tais como:
"Intimidade
No coração da mina mais secreta,
No interior do fruto mais distante,
Na vibração da nota mais discreta,
No búzio mais convolto e ressoante,
Na camada mais densa da pintura,
Na veia que no corpo mais nos sonde,
Na palavra que diga mais brandura,
Na raiz que mais desce, mais esconde,
No silêncio mais fundo desta pausa,
Em que a vida se fez perenidade,
Procuro a tua mão, decifro a causa,
De querer e não crer, final, intimidade."
in "Os Poemas Possíveis", de José Saramago
"Baralho
Lanço na mesa as cartas de jogar:
Os amores de cartão e as espadas,
Os losangos vermelhos de ouro falso,
A trilobada folha que ameaça.
Caso e descaso as damas e os valetes.
Andam os reis pasmados nesta farsa.
E quando conto os pontos da derrota,
Sai-me de lá a rir, como perdido,
Na figura do bobo o meu retrato."
in "Os Poemas Possíveis", de José Saramago
e
"D. Quixote
Não vejo Dulcineias, D. Quixote,
Nem gigantes, nem ilhas, nada existe
Do teu sonho de louco.
Só moinhos, mulheres e Baratárias,
Coisas reais que Sancho bem conhece
E para ti são pouco."
in "Os Poemas Possíveis", de José Saramago
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