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Leituras - "As Cinquenta Sombras de Grey"

de E L James. 2011.

Depois de tanto ouvir falar sobre este livro e respectiva triologia, depois de tanta palavra escrita e falada (e talvez gasta, quiçá?!) sobre o assunto... Uns porque amaram, outros porque odiaram, outros ainda que leram mas tinham vergonha de dizê-lo, outros mais que davam tudo para ler mas "não podem" porque bla bla bla.. de uma coisa não há dúvida: a melhor estratégia de marketing é aquela que leva as pessoas a falarem sobre determinado produto, bem ou mal não interessa, e isso aconteceu com este livro, porque tem tido imensa publicidade.

Tenho um apontamento quanto ao título traduzido para português: "As 50 Sombras de Grey". Eu concordaria mais com o título brasileiro "50 tons de Cinza" porque, embora Grey seja uma das personagens principais e embora a palavra Grey traduzida seja de facto "cor cinza", no meu entender e após a leitura do livro faz muito mais sentido apelar às tonalidades e espectro de cores porque na história elas são frequentemente utilizadas para caracterizar, aí sim, a personalidade e o íntimo das personagens, e para descreverem emoções e sentimentos. Cores escuras, frias e sombrias para os segredos e tabus, para o lado negro da alma. Cores claras para o amor, pureza e bondade.

Gostei do livro mas não fiquei viciada nem desesperada por ler os seguintes. Acho até que nem o vou fazer porque interiormente já conclui a história para mim.
Há pouco tempo vi um episódio dos Simpsons que retrata muito bem aquilo que às vezes penso sobre estes livros escritos por ilustres desconhecidos, histórias bombásticas e êxitos de vendas, que se adaptam perfeitamente ao cinema. Há uma possível e teórica ou paralela realidade sobre estes fenómenos literários que bem vistas as coisas não passam de meros produtos postos nas prateleiras das lojas que somos levados a desejar ter e logo a comprar, porque não nasceram da real inspiração de um escritor que se dedicou à obra e quis partilhar e transmitir uma historia inventada ou contada por si. Este tipo de livros, cujos autores são no mínimo suspeitos (se repararem nunca têm nomes claros, são quase sempre siglas e depois um nome banal) foram pensados e idealizados numa mesa de reuniões de uma qualquer grande empresa ou editora, por um conjunto de comerciais, baseados em estudos de mercado, que produzem e investem em histórias que contenham os ingredientes básicos de sucesso (neste caso tem muito sexo e temas tabus!!!). Depois a história é construída de forma a "fazer render o peixe" como se costuma dizer....palha aqui, um bocadinho de desenvolvimento acolá, mais palha, mais palha, umas quantas passagens mais ou menos descritivas de sexo, palha e pronto...tal qual uma novela, que acaba por prender as pessoas e dá a possibilidade às editoras de obter mais lucros através das triologias e afins, e adaptações ao cinema. Para mim, as 50 shades, o crepúsculo e até o harry potter podem muito bem encaixar nesta "teoria da conspiração" (is it?!). Bem, mas já lido o livro aqui vai o comentário.

Anastasia Steele é uma estudante de literatura. É jovem, bonita mas muito insegura, fechada e inexperiente. Christian Grey é jovem, rico, poderoso e apaixona-se por Anastasia. (oh a sério?!! como é que isso foi possível!?!) Os dois são muito diferentes. É um amor à partida sem chance de vingar porque cada um pertence a um mundo oposto. Ele seduz-la e basicamente abre-lhe a porta para o mundo do sexo, das sensações e do prazer. E ela, abre-lhe (as pernas e não só!!...:D), e sem saber, a porta para a normalidade e para o amor enquanto partilha e cura. Surge como background desta história a diferença entre foder e fazer amor. A diferença na forma de amar e desejar. A diferença entre o cérebro do homem e da mulher. A diferença de necessidades (e não apenas sexuais). A procura no outro de algo que complete o ser. O dar para receber. O partilhar e o sentido que isso tem.
Outro dia ouvi na tv que este livro tem sido considerado pornografia para mamãs. Credo! Isso dá-me vontade de rir. Não acho que o livro tenha nada de especial. Principalmente para mamãs (é que as outras ainda podem ser púdicas ou até pseudo-virgens mas mamãs deste mundo! se já têm filhos não me venham dizer que os seus bebés vieram numa cegonha...
 Esta é apenas uma história, um romance que conjuga, como tantas outras histórias que prendem a atenção das pessoas, factores que se ligam entre si e por acaso (ou talvez não) inclui algumas descrições sexuais e aborda o sadismo e o bondage/fetichismo. Ele, Grey, é o experiente e malévolo mas acabamos por perceber que é ele que mais precisa aprender, a dar-se e abrir o coração. Caso contrário consome-se no buraco negro que é a sua alma, magoada e fria.
Aparte dos encontros e das coisas que eles fazem (que não deixam de ser interessantes mas também não são nada de acima de extraordinário!!), na cama entenda-se (e noutros sítios... :))), para mim interessava-me, ao longo da história, saber ao certo o passado dele, donde vieram as cicatrizes que tinha no peito, porque não gostava que o tocassem, porque se afastava (superiorizando-se) dos outros, porque é que apenas conseguia sentir prazer com dominância e violência. Queria acima de tudo saber que passado foi construído para esta personagem, que explicasse as suas atitudes e forma de ser. Cheguei ao final do livro e só fiquei a saber que ele tinha sido adoptado, a mãe era uma prostituta  (isto subentendi...) , uma viciada em crack, que o maltratou e marcou para a vida, física e psicologicamente.
Numa das últimas passagens, e ainda que a autora não conclua isso no livro, Anastasia "portou-se mal" e foi castigada severamente pelo seu senhor (Christian Grey, o dominador). A punição/correctivo foi de tal forma violento e inesperado que ela fica realmente magoada. De tal forma que, após ter levado uma valente sova, tem uma reacção normalíssima: afasta-se, contrai-se e não deixa que lhe toquem, nem que seja para lhe fazer uma festa ou um carinho. Por isso para mim é óbvio que ele não gosta e não deixa que os outros se aproximem dele não é porque é rico, culto e bem sucedido, mas sim porque foi muito magoado, está traumatizado de forma severa e portanto assume uma postura dominadora e ilusoriamente controladora. Interiormente ele está um caos e portanto precisa de sentir que controla algo, como um bote salva-vidas perdido algures no meio do oceano. Acho que isso é o que faz mais sentido.

Palavras ou ideias que me ficaram do livro:

...(acerca de liderança)... Trata-se mesmo de ter as pessoas certas na equipa e de direccionar adequadamente as energias delas."
 "O crescimento e desenvolvimento das pessoas é a forma mais nobre de liderança" - Harvey Firestone

"...de noite já muito tarde ou de manhã ainda muito cedo..."

"apaixonado, hipnótico, obsessivo, bárbaro,..."

"existe uma linha muito ténue a separar o prazer da dor. São dois lados da mesma moeda e um não existe sem o outro. Posso mostra-te o prazer que existe na dor."

"confias em mim?"

" porque não gostas que te toquem? - susurrei olhando para os seus olhos cinzentos claros.
Porque estou lixado da cabeça em cinquenta sombras."

"o discurso era muito claro....tudo preto no branco e não nas vagas e intangíveis nuances de cinzento que coloriam o meu mundo."

"pela primeira vez na vida, sentia-me infeliz na minha própria companhia"

Estar só é muito diferente de ser só. Muito....

"fiquei chocada por me sentir excitada" e "a minha deusa interior sorriu para mim" mas "o meu subconsciente não deixava". "A deusa interior raramente usa o cérebro para pensar."
A luta entre o que nos ensinam e o que experimentamos.
Só pensamos com o cérebro?!

"pelas luzes de néon dos candeeiros de rua, o seu rosto aparecia e desaparecia intermitentemente na luz e na escuridão" "...ele era um homem com sérias e profundas lacunas emocionais... arrastando-me para a escuridão"

concupiscente - cobiçar, desejar ardentemente.

"Quais são as palavras de segurança, Anastacia?" " Amarelo" e " Vermelho".... as cores....sempre as cores...

"Christian tocava piano, envolto pela escuridão sentado numa bolha de luz, a tocar... e o seu cabelo brilhava com nuances lustrosas, acobreadas". "Parecia perdido, triste e dolorosamente só."

"tento desesperadamente manter as minhas emoções empilhadas à distância".... Será isso possível? Empilhar emoções? Precisamente porque se tratam de... emoções...

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