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Why God Why?!

Apercebi-me do quão contraditórias podem ser as comunidades pequenas... ou antes, as pequenas comunidades! Se por um lado as pessoas todas se conhecem umas às outras e todas se entre-ajudam, por outro também é nesses meios que as pessoas conseguem ser mais cruéis umas com as outras... o que nunca se esperaria precisamente porque estão mais próximas...
Faleceu uma pessoa da minha família. Residente numa pequena povoação do interior alentejano. A pessoa que faleceu era e continuará sempre a ser uma pessoa muito especial e querida por toda a gente que não apenas os respectivos familiares. Uma pessoa que para sempre será recordada pelo seu jeito sereno e carinhoso, pelo seu sorriso e generosidade e acima de tudo pelo grande coração que tinha e que sempre nos inspirou. Para mim, ela representava não apenas um exemplo de vida e de como gostaria de chegar à velhice, mas também o elo que ainda existia com os meus antepassados maternos. Ela era irmã do meu avô materno, que nunca cheguei a conhecer... :(

Apercebi-me mais claramente de uma coisa que obviamente sempre soube mas nunca senti directamente ou porque era mais nova e nem me apercebia disso. Vi muita gente a acompanhar a família e o corpo. Muita gente da terra que fez questão de estar presente, a apoiar. Ou apenas a estar presente... bem... isso acaba por não interessar uma vez que ninguém na família está a olhar a isso. Mas essas mesmas pessoas que ali vão acompanhar e apoiar (ou na minha opinião... em muitos casos vão apenas observar... ) são as mesmas que irão criticar essa mesma família caso estes optem por não fazerem o luto vestindo-se a partir desta data sempre de preto, da cabeça aos pés.

Ainda me lembro da minha avó usar um lenço preto o tempo todo. E de vestir sempre de preto... Já o meu avó tinha morrido há muitos anos. E assim o fez, ela, até ela própria também morrer. Sempre achei essa imagem muito carregada e adorava vê-la em casa a tirar o lenço e a mostrar-nos os seus longos cabelos impecavelmente penteados numa trança e depois num monho. Mas de qualquer forma sempre conheci a minha avó assim e penso que para ela era normal, fazia-o porque era sua vontade, e crença também. Assim tudo bem!

Eu gosto da cor preta. Sempre gostei, como gosto de outras. E tenho muita roupa preta. Mas não me cabe na cabeça (não é o lenço! antes fosse!) a ideia de obrigação de ter de vestir preto como forma de mostrar luto ou tristeza. Pessoas diferentes vivem e experienciam o luto de forma diferente. A vida é tão curta... de que vale a pena preocuparmo-nos com o que os outros pensam de nós?! Já pensaram nisso? No quão ridículo isso é? Percebo que para as pessoas mais velhas o peso da tradição ainda seja muito grande... e a morte fosse efectivamente um grande estigma, mas não consigo compreender como é que pessoas mais novas ainda continuam a criticar se alguém a quem tenha morrido outro alguém não passe a vestir-se todo de preto só porque sim, só porque assim é que deve ser. Se a pessoa tem essa vontade, se levanta de manhã e lhe apetece vestir preto todos os dias, se é assim que se sente então faça-o, mas nunca por obrigação ou como se estivesse a pagar uma promessa. Isso é tortura, puramente tortura. Quer dizer... não basta já ter-lhe morrido alguém como ainda tem de carregar essa cruz?!?! Eu digo: Cruz Credo! Espero que as pessoas acordem de uma vez para a vida e se ajudem e amem umas às outras... sem exigências nem leis nem religiões que incutam pecado ou culpa. Deus existe sim. Não é um corpo, é uma energia, vida, somos nós, é amor. Ele não pune, não castiga, sempre ama e sempre aceita. Isso sim é que é bonito de se ser e de ver. Vá a ver se aprendem isso de uma vez por todas se não... não estão a viver, apenas a existir.

Comentários

João Bento disse…
Acho que estás a ser dura demais com as pessoas...
Acho que estás a ver as coisas apenas da perspectiva moderna! Mas a verdade é que não é assim tão "descabido" como isso...
O luto não é nem nunca foi uma tortura para a mulher, ou homem, que também os existe, os que o façam. Mas num tempo em que apenas existia um amor, uma pessoa, compreendo que isso é o patamar máximo de dedicação e carinho para com a pessoa da nossa vida! Um recordar, sentir e amar dia a dia...
A diferença é que as pessoas desses meios ainda acreditam que o preto tem esse simbolismo e ao verem alguém não o fazer, acham algo estranho (Uma ausência de amor e carinho).
Ninguém diz para a família se vestir de preto para o resto da vida, mas o luto pode ser feito apenas no funeral! Até porque se pensares bem, essa talvez fosse a maneira/forma que qualquer pessoa idosa gostasse de ser homenageada! Não estás a carregar uma cruz, estás a mostrar amor, carinho e respeito. Não para os outros mas para com aquela pessoa que partiu e que se calhar pensa dessa forma.

Os meus pêsames, espero a cima de tudo que sempre recordes essa pessoa pelo melhor que ela foi! Sem nunca esquecer o que ela te amava...

Um beijo grande!
Ana Dionísio disse…
Sim, mas se vires bem acho que não estamos em desacordo. Eu também acho e acredito que se a pessoa sentir essa vontade... de fazer luto através da roupa que veste então acho admirável e louvável esse gesto de entrega, mas desde que feito por vontade própria, nunca por imposição (ainda que indirecta por parte da comunidade). As coisas que se fazem só por fazer não têm sentido nenhum. Não acho que um familiar sinta mais a falta de um ente querido falecido só porque anda vestido de preto da cabeça aos pés. A tristeza é uma coisa que se sente, não necessariamente que se vê.

Obrigada pelo teu comentário ;)

beijinho grandi!

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